Livro de artista (exemplar único), colecção de livros de artista do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, 2009
Breve nota sobre o livro-objecto “Já-mostrado” (2009).
“Já-mostrado” antes de ser livro foi uma ideia que me ocupou durante cerca de 2 anos, a qual motivou vários trabalhos e pelo menos três exposições: Pack (Reitoria, 2007), Ready-showed (Galeria JUP, 2008), Retrospectiva (Espaço Ilimitado, 2009). Começando pelo início. Em 2007 realizei uma instalação intitulada “pós-cabo” na sala de exposições da Reitoria no contexto de uma exposição colectiva do primeiro grupo de estudos do Mestrado em Práticas Artísticas Contemporâneas da Faculdade de Belas Artes da UP (Eduardo Matos, João Marçal, José Almeida Pereira, Max Fernandes, Carla Filipe, Maria Mire, entre outros). No final da exposição decidi fotografar não apenas a acção de desmontagem da instalação como também as cicatrizes do espaço, os vestígios da intervenção, em resumo, uma certa ideia de pós-obra que me interessava sobremaneira. Todo o material da desmontagem assim como os registos fotográficos foram reunidos e reeditados servindo posteriormente como matéria de trabalho para uma nova exposição na Galeria do Jornal Universitário do Porto que veio a intitular-se como “Ready-showed”.
Esta nova exposição mostrava de forma deliberada e provocadora os fragmentos ou estilhaços da exposição anterior, introduzindo uma espécie de decepção no visitante. Evidentemente o título reenvia-nos ironicamente não só para as estratégias subversivas de Marcel Duchamp, como também nos introduz a uma reflexão sobre a híper-visibilidade da práctica artística, sobre a vertiginosa disseminação das imagens nos diferentes palcos virtuais, assim como sobre a nossa submissão à ditadura do novo ou da novidade. “Ready-showed” era sobre isto e sobre muitas outras coisas que também se relacionam com a efemeridade, com as estratégias de mediação, documentação e divulgação do trabalho artístico.
Não satisfeito, a mesma metodologia radicalizou-se ainda mais. A desmontagem de “Ready-showed” foi novamente fotografada, dando origem a um arquivo de imagens que foram objecto e pretexto de um intenso trabalho nos meses seguintes. Parte das imagens (da desmontagem) foram o ponto de partida para a construção de diversas maquetas que mimetizavam inteiramente as imagens (numa altura em que Thomas Demand ainda reverberava na minha cabeça) para depois serem (re)fotografadas sob o mesmo ponto de vista, formulando um conjunto de novas fotografias que mais não eram do que: fotografias de maquetas de fotografias de desmontagens de exposições. Uma espécie de mise en abyme vertiginoso sobre as imagens do meu próprio trabalho, com humor diria que se tratava de uma autofagia galopante. Mas não foram só maquetas, uma das fotografias foi alvo de uma cópia híper-realista em pintura (com um claro aumento de escala) para também posteriormente esta imagem pictórica ser destruída com tinta branca através de uma acção performativa filmada e devolvida ao espectador através de um reverse.
Em síntese, o livro que este texto objectiva contextualizar, surge como uma decantação natural das imagens produzidas ao longo de toda esta complexa teia laboratorial. Por conseguinte, apresenta-se como um objecto autónomo que evoca de forma livre e poética toda a experimentação levada a cabo nos diferentes projectos: o jogo de tradução entre meios; a evocação irónica a Marcel Duchamp (na aproximação ao centenário dos seus primeiros ready-made); a problematização sobre os modos de visibilidade da prática artística; ou o questionamento subversivo sobre a proliferação e natureza da imagem fotográfica (enquanto entidade estética na óptica do foto-conceptualismo, documento que invoca a presença de uma ausência – Foto-recordação, transparência de obras para reprodução ou registo jornalístico de obras em exibição).